Por José Antonio Lima, na revista CartaCapital:
Na quarta-feira 30, dia em que o Bolsa Família completou dez anos, o
senador Aécio Neves (MG), presidente nacional do PSDB, divulgou um
projeto de lei inusitado. O tucano deseja tornar permanente o programa
que, por anos, atacaram. A mudança de posição chama a atenção, mas não é
uma surpresa completa. Ela vem sendo construída por meio de declarações
há algum tempo, mas agora toma a forma de um ato político, cujo
objetivo é tentar remodelar a imagem do PSDB às vésperas das eleições de
2014.
No primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o PSDB se dedicou
a deslegitimar o Bolsa Família. Tucanos de várias estirpes afirmavam,
como revela uma busca simples no próprio site do partido, que o programa
era “esmola governamental”, “esmola eleitoreira”, feito para “atingir as metas eleitorais do PT”,“assistencialismo simplista que não apresenta benefícios concretos”. Em editorial intitulado “Bolsa Esmola”
e publicado em 13 de setembro de 2004, o PSDB afirmava que o programa
“reduziu-se a um projeto assistencialista” e “resignou-se a um populismo
rasteiro”.
Esse discurso criou dois grandes problemas para o PSDB.
O primeiro é dificultar, diante da consagração do programa, que o
eleitor ligue o partido ao Bolsa Família. Teria sido fácil para o
partido lembrar que o Bolsa Família teve início como uma junção de quatro programas do governo tucano de Fernando Henrique Cardoso (Bolsa Escola, PNAA, Bolsa Alimentação e Auxílio-Gás) e que aideia de unir os benefícios
foi dada a Lula por um tucano, o governador de Goiás, Marconi Perillo.
As críticas distanciaram o PSDB da origem do projeto. E abriram espaço
para o PT assumir a paternidade e os dividendos eleitoras do programa a
partir da sua ampliação e sofisticação. Hoje o governo é premiado pela instituição do Bolsa Família, reconhecido mundialmente.
O segundo problema criado pelo discurso do PSDB foi atrair para sua base
eleitoral alguns dos setores mais reacionários da sociedade brasileira,
os Almeidinhas
sobre os quais escreve Matheus Pichonelli. Essa é uma fatia do
eleitorado capaz de produzir furor nas redes sociais ao questionar o
sufrágio universal, mas insignificante demais para eleger alguém a um
cargo público. Como afirmou a ministra Tereza Campello a CartaCapital
recentemente, não se discute mais quem é contra ou a favor do Bolsa Família.
Com Aécio Neves no comando, a cúpula do PSDB parece estar ciente de que o
Bolsa Família é quase uma unanimidade. Muitos dos militantes do
partido, entretanto, precisarão passar por uma reeducação. Em maio, na
convenção que elegeu Aécio presidente do partido, o senador mineiro
afirmou que o “DNA” do PSDB “está
em todos os programas de transferência de renda”. Antes dele, porém,
tucanos de menor expressão subiram ao palco para reclamar do “bolsa
esmola”.
Dois argumentos eleitorais podem ajudar a militância do PSDB a se
convencer de que bater no Bolsa Família não é uma boa ideia. O primeiro é
resgatar a herança de FHC. Após três derrotas eleitorais, o partido
diagnosticou que um de seus problemas foi se distanciar daquele governo.
Por ocasião da convenção partidária que elegeu Aécio, em maio, o
instituto FHC publicou um documento em favor da tese do DNA tucano do Bolsa Família. Era um recado ao partido.
O PSDB busca, assim, uma vacina contra a costumeira acusação de que, se
chegar ao poder, vai acabar com o Bolsa Família. Esse tipo de
argumentação é tão frequente que apareceu até mesmo nas últimas eleições
municipais de Salvador. No ano passado, ACM Neto (do DEM, outro partido
da linha “bolsa esmola”) teve de invocar a figura do avô contra os
boatos de que o programa estaria ameaçado caso assumisse a capital
baiana. Para isso, lembrou que o então senador Antonio Carlos Magalhães
foi um dos artífices da criação do Fundo Nacional de Combate e
Erradicação da Pobreza, batalha na qual derrotou o então ministro da
Fazenda de FHC, Pedro Malan, contrário ao projeto por conta das pressões
do Fundo Monetário Internacional.
A nova postura do partido é, antes de tudo, uma vitória para o Bolsa
Família. Maior programa de transferência de renda do mundo, e inspiração
para diversos outros países, o Bolsa Família deveria, como afirmou a
socióloga Walquiria Domingues Leão Rego, ser um direito constitucionalizado. Ainda que imperfeito, é ainda fundamental para o País.
Postado há 1 hour ago por FRAZÃO
Do Blog Justiceira de Esquerda.
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