Do Escrevinhador - publicada sexta-feira, 16/05/2014 às 20:11 e atualizada sexta-feira, 16/05/2014 às 20:45
por Rodrigo Vianna
O debate de abertura ainda não tinha acabado, quando um burburinho começou a se ouvir pelos corredores. E não era Stanley quem se aproximava. Mas Lula. O ex-presidente e a regulação da mídia no Brasil são dois fantasmas, que provocam calafrios na velha imprensa dos Civita, Frias e Marinhos. Então, podem se preparar: os calafrios vão aumentar. Os locutores gagos da CBN vão ficar ainda mais gagos.
O auditório estava lotado: mais de trezentos blogueiros e ativistas digitais de todo o Brasil. Três dezenas de jornalistas, cinegrafistas e fotógrafos da velha mídia já se aglomeravam no fundo do salão. Na mesa, o jornalista espanhol Pascual Serrano demolia o surrado conceito de “liberdade de imprensa” que os donos da mídia usam para brecar qualquer regulação.
“Só um setor da sociedade pode utilizar a chamada liberdade de imprensa. É um direito apenas para o empresariado”, disse Serrano, um dos convidados internacionais do Quarto Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais.
O norte-americano Andrés Conteris, do site Democracy Now, disse que os blogs – no mundo todo – cumprem um papel decisivo: “ir aos locais onde está apenas o silêncio”.
O professor brasileiro Venício Lima, da UnB, falou sobre a regulação necessária. Não na Venezuela, nem em Cuba. Mas na Inglaterra. A regulação foi um imperativo, depois da barbárie imposta pelos jornais do multimilionário Murdoch.
Venício também analisou a lei aprovada na Argentina: a chamada “Ley de Medios” não trata do conteúdo. Não impõe qualquer censura. “É uma lei antimonopólio, que regula o mercado”, explicou Venício.
Quando o professor terminava sua fala, o burburinho aumentou. Era Lula que chegava. Inspirado, bem-humorado, dirigiu-se primeiro ao grupo de jornalistas que trabalham para a velha mídia: “a imprensa me trata sempre muito bem; só que quando faço críticas à imprensa, dizem que é um ataque, e quando a imprensa me ataca eles dizem que são apenas críticas”.
Lula trouxe a Comunicação para o centro do debate. Lembrou os ataques violentos desferidos pela velha mídia contra os blogueiros que o entrevistaram recentemente: “eu não sabia que vocês chamavam tanta atenção da imprensa”, disse o ex-presidente. “Fiquei meio deprê com a violência que os meios utilizaram para atacar quem estava naquela entrevista”.
Lula contestou também a imprensa pela tentativa de criar um clima de pessimismo na economia. “A inflação está controlada há 11 anos; mas pra controlar a inflação eles querem provocar desemprego. É isso que os tucanos querem. Nós não queremos”.
Atacou ainda a elite brasileira, que não aceita os programas de inclusão social, não aceita negros e pobres nas universidades. “Nós cansamos de ser apenas pedreiros, nós queremos ser engenheiros”, falou Lula.
O ex-presidente atacou o clima de “antipolítica” insuflado pela mídia. “Quando se tenta negar a política, o que vem depois é muito pior”; e lembrou de Hitler e Mussolini. “A tentativa é de desmoralizar não a Política, mas as instituições.”
Lula defendeu uma Constituinte exclusiva para a Reforma Política. “Esse Congresso não fará a Reforma Política que o Brasil precisa”. E defendeu também a Regulação da Mídia. Mandou o recado, com todas as letras: “Daqui pra frente, em cada ato que eu for, toda vez que eu abrir a boca, vou lembrar a questão da regulação da mídia”.
Lula estava em grande forma. Mas o mais importante foi a sinalização. Ele tinha sido o primeiro presidente a dar entrevista a blogueiros dentro do Palácio (2010). Há menos de um mês, deu outra entrevista aos blogs – deixando os mervais e os comentaristas gagos da CBN bastante irritados.
Agora, Lula deu o sinal para o PT: a disputa política não se fará sem encarar de frente a batalha da Comunicação.
A mídia vai acusar o golpe. Será que vão continuar brincando de “Volta, Lula”? Se Lula voltar, vem aí – com ele – a regulação da velha mídia no Brasil. A Globo precisa ser partida em vários pedaços – como a Argentina fez com o grupo Clarin. “E não me venham falar que isso é censura” – disse Lula.
O movimento de blogueiros colheu uma enorme vitória. Ajudou a pautar esse debate, agora encampado pelo maior líder popular brasileiro.
E Lula nem precisa voltar. Ele pautou a Regulação da mídia. Dilma não poderá mais escapar do tema. A fase dos omeletes com Ana Maria Braga está encerrada.
Lula sabe que não há escolha. O PT fugiu desse debate durante muitos anos. Mas o debate veio até o PT.
Sentado, na primeira fila, enquanto Lula falava aosblogueiros, estava o prefeito Fernando Haddad. Assim como Dilma, Haddad parece não ter percebido que essa era uma batalha absolutamente necessária. Depois de eleito com apoio das redes sociais e de amplos movimentos digitais, Haddad mandou dizer que o tema da Comunicação não era prioridade. Nomeou um jornalista convencional para cuidar da Comunicação. A política da Prefeitura de São Paulo é ligar para Folha e Estadão e pedir espaço pra responder aos ataques.
Haddad, sem Comunicação, está com a popularidade em baixa. Tem se queixado. Lula disse claramente ao prefeito que “é preciso entender melhor esse meio chamado internet”. Aplausos intensos tomaram o plenário.
Mais adiante, Lula voltou ao tema, dirigindo-se de novo ao prefeito paulistano. Alguém, no fundo do auditório gritou: “Haddad, você precisa fazer sua propaganda”. E Lula respondeu: “Não é propaganda. É enfrentar o debate”.
Enfrentar o debate. O recado estava dado. Haddad apenas ouviu. Não se sabe até que ponto compreendeu o que o ex-presidente quis dizer.
O PT passou doze anos legitimando o grande inimigo. Ministros petistas (?) foram às páginas amarelas da “Veja”. Líderes petistas disputam espaço nas colunas de jornais – que são a ponta de lança da oposição tucana.
Lula entendeu que é preciso tratar a velha mídia como o inimigo a ser derrotado.
Foi essa mídia velha que levou Vargas ao suicídio em 54. O povão trabalhista sabia quem era o inimigo. Por isso, a massa enfurecida queimou “O Globo” e o jornal de Carlos Lacerda em 54.
Não é mais preciso queimar a Globo. Basta aprovar uma lei democrática para a Comunicação. Pra isso, é preciso travar esse debate. O povão lulista também sabe reconhecer o inimigo mais perigoso.
Lula entrou na briga. Pra valer.
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A Globo precisa ser partida em vários pedaços – como a Argentina fez com o grupo Clarin. “E não me venham falar que isso é censura” – disse Lula. O movimento de blogueiros colheu uma enorme vitória. Ajudou a pautar esse debate, agora encampado pelo ex-presidente.
Sob os olhares de Ênio Barroso e Conceição Lemes, Lula avisa: a brincadeira acabou
por Rodrigo Vianna
O debate de abertura ainda não tinha acabado, quando um burburinho começou a se ouvir pelos corredores. E não era Stanley quem se aproximava. Mas Lula. O ex-presidente e a regulação da mídia no Brasil são dois fantasmas, que provocam calafrios na velha imprensa dos Civita, Frias e Marinhos. Então, podem se preparar: os calafrios vão aumentar. Os locutores gagos da CBN vão ficar ainda mais gagos.
O auditório estava lotado: mais de trezentos blogueiros e ativistas digitais de todo o Brasil. Três dezenas de jornalistas, cinegrafistas e fotógrafos da velha mídia já se aglomeravam no fundo do salão. Na mesa, o jornalista espanhol Pascual Serrano demolia o surrado conceito de “liberdade de imprensa” que os donos da mídia usam para brecar qualquer regulação.
“Só um setor da sociedade pode utilizar a chamada liberdade de imprensa. É um direito apenas para o empresariado”, disse Serrano, um dos convidados internacionais do Quarto Encontro de Blogueiros e Ativistas Digitais.
O norte-americano Andrés Conteris, do site Democracy Now, disse que os blogs – no mundo todo – cumprem um papel decisivo: “ir aos locais onde está apenas o silêncio”.
O professor brasileiro Venício Lima, da UnB, falou sobre a regulação necessária. Não na Venezuela, nem em Cuba. Mas na Inglaterra. A regulação foi um imperativo, depois da barbárie imposta pelos jornais do multimilionário Murdoch.
Venício também analisou a lei aprovada na Argentina: a chamada “Ley de Medios” não trata do conteúdo. Não impõe qualquer censura. “É uma lei antimonopólio, que regula o mercado”, explicou Venício.
Quando o professor terminava sua fala, o burburinho aumentou. Era Lula que chegava. Inspirado, bem-humorado, dirigiu-se primeiro ao grupo de jornalistas que trabalham para a velha mídia: “a imprensa me trata sempre muito bem; só que quando faço críticas à imprensa, dizem que é um ataque, e quando a imprensa me ataca eles dizem que são apenas críticas”.
Lula trouxe a Comunicação para o centro do debate. Lembrou os ataques violentos desferidos pela velha mídia contra os blogueiros que o entrevistaram recentemente: “eu não sabia que vocês chamavam tanta atenção da imprensa”, disse o ex-presidente. “Fiquei meio deprê com a violência que os meios utilizaram para atacar quem estava naquela entrevista”.
Lula contestou também a imprensa pela tentativa de criar um clima de pessimismo na economia. “A inflação está controlada há 11 anos; mas pra controlar a inflação eles querem provocar desemprego. É isso que os tucanos querem. Nós não queremos”.
Atacou ainda a elite brasileira, que não aceita os programas de inclusão social, não aceita negros e pobres nas universidades. “Nós cansamos de ser apenas pedreiros, nós queremos ser engenheiros”, falou Lula.
O ex-presidente atacou o clima de “antipolítica” insuflado pela mídia. “Quando se tenta negar a política, o que vem depois é muito pior”; e lembrou de Hitler e Mussolini. “A tentativa é de desmoralizar não a Política, mas as instituições.”
Lula defendeu uma Constituinte exclusiva para a Reforma Política. “Esse Congresso não fará a Reforma Política que o Brasil precisa”. E defendeu também a Regulação da Mídia. Mandou o recado, com todas as letras: “Daqui pra frente, em cada ato que eu for, toda vez que eu abrir a boca, vou lembrar a questão da regulação da mídia”.
Lula estava em grande forma. Mas o mais importante foi a sinalização. Ele tinha sido o primeiro presidente a dar entrevista a blogueiros dentro do Palácio (2010). Há menos de um mês, deu outra entrevista aos blogs – deixando os mervais e os comentaristas gagos da CBN bastante irritados.
Agora, Lula deu o sinal para o PT: a disputa política não se fará sem encarar de frente a batalha da Comunicação.
A mídia vai acusar o golpe. Será que vão continuar brincando de “Volta, Lula”? Se Lula voltar, vem aí – com ele – a regulação da velha mídia no Brasil. A Globo precisa ser partida em vários pedaços – como a Argentina fez com o grupo Clarin. “E não me venham falar que isso é censura” – disse Lula.
O movimento de blogueiros colheu uma enorme vitória. Ajudou a pautar esse debate, agora encampado pelo maior líder popular brasileiro.
E Lula nem precisa voltar. Ele pautou a Regulação da mídia. Dilma não poderá mais escapar do tema. A fase dos omeletes com Ana Maria Braga está encerrada.
Lula sabe que não há escolha. O PT fugiu desse debate durante muitos anos. Mas o debate veio até o PT.
Sentado, na primeira fila, enquanto Lula falava aosblogueiros, estava o prefeito Fernando Haddad. Assim como Dilma, Haddad parece não ter percebido que essa era uma batalha absolutamente necessária. Depois de eleito com apoio das redes sociais e de amplos movimentos digitais, Haddad mandou dizer que o tema da Comunicação não era prioridade. Nomeou um jornalista convencional para cuidar da Comunicação. A política da Prefeitura de São Paulo é ligar para Folha e Estadão e pedir espaço pra responder aos ataques.
Haddad, sem Comunicação, está com a popularidade em baixa. Tem se queixado. Lula disse claramente ao prefeito que “é preciso entender melhor esse meio chamado internet”. Aplausos intensos tomaram o plenário.
Mais adiante, Lula voltou ao tema, dirigindo-se de novo ao prefeito paulistano. Alguém, no fundo do auditório gritou: “Haddad, você precisa fazer sua propaganda”. E Lula respondeu: “Não é propaganda. É enfrentar o debate”.
Enfrentar o debate. O recado estava dado. Haddad apenas ouviu. Não se sabe até que ponto compreendeu o que o ex-presidente quis dizer.
O PT passou doze anos legitimando o grande inimigo. Ministros petistas (?) foram às páginas amarelas da “Veja”. Líderes petistas disputam espaço nas colunas de jornais – que são a ponta de lança da oposição tucana.
Lula entendeu que é preciso tratar a velha mídia como o inimigo a ser derrotado.
Foi essa mídia velha que levou Vargas ao suicídio em 54. O povão trabalhista sabia quem era o inimigo. Por isso, a massa enfurecida queimou “O Globo” e o jornal de Carlos Lacerda em 54.
Não é mais preciso queimar a Globo. Basta aprovar uma lei democrática para a Comunicação. Pra isso, é preciso travar esse debate. O povão lulista também sabe reconhecer o inimigo mais perigoso.
Lula entrou na briga. Pra valer.
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