segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Aonde vai Marina

Ricardo Melo

A candidata das eleições deste ano não é a mesma de 2010, tampouco as circunstâncias

Na sequência imediata de eventos como a morte de Eduardo Campos, poucas certezas se impõem. Já as incógnitas se multiplicam. Qualquer enquete ou pesquisa feita "à quente" sob o impacto do desastre aéreo será de pouca serventia. O efeito da comoção causada pelo acidente inevitavelmente terá um peso significativo, o que torna os números descartáveis em termos de previsões do cenário político.

Nem sempre é assim. Um de tantos exemplos: em 1988, a morte de três grevistas em Volta Redonda (em novembro) impulsionou a vitória de vários candidatos do PT em prefeituras, inclusive o triunfo de Luiza Erundina em São Paulo. Diferenças cruciais: embora sem a projeção de um político presidenciável, as três vítimas morreram num conflito sindical e a poucos dias do pleito. Agora, o prazo que separa a tragédia de Santos do dia da eleição presidencial é tempo suficiente para diluir o fator comoção.

Muita gente dá como favas contadas um segundo turno. Será? Sem pretender diminuir as qualidades de Eduardo Campos, o fato é que ele ainda engatinhava como liderança nacional. Nem sequer teve tempo de deixar um legado político expressivo, difere ntemente do avô Miguel Arraes. E as últimas ações do neto iam no sentido contrário da decantada novidade que dizia representar.

Campos patrocinou alianças com Deus e o diabo em seu Estado e pelo país afora. Para os correligionários, uma prova de "capacidade de articulação", a velha desculpa para engavetar princípios em troca de dividendos na urna. Adversários e observadores tarimbados faziam uma leitura distinta. Identificaram nas atitudes do ex-governador apenas mais do mesmo oportunismo eleitoral prevalecente no Brasil.

Em termos programáticos, Campos recorria às generalidades de sempre. Espremida, a bandeira da terceira via resumia-se ao seguinte: se você está cansado dos petistas e dos tucanos, vote no PSB. Depois a gente vê o que faz. Fora a situação esdrúxula de uma chapa em que a vice aparecia em pesquisas com mais que o dobro dos votos do candidato oficial.

Sobrou para Marina Silva. Impossibilitada de emplacar sua própria legenda, adotou o PSB como uma espécie de barriga de aluguel. De repente virou a estrela da companhia. Mas, no curto tempo em que Rede e PSB já conviveram, as faíscas se espalharam. As alianças regionais criaram um clima de atrito permanente (curiosidade: Marina e Alckmin vão subir no mesmo palanque em São Paulo?). O discurso ambientalista da Rede viu-se confinado a um quadro moldado por valores coronelistas e interesses do grande agronegócio. Não é à toa que muito "marineiro" de primeira hora não gostou do que viu e pulou fora do barco.

A personalidade de Marina Silva garantiu a ela, por um tempo, um papel singular na política nacional. Mas a candidata de 2014 não é a mesma de 2010, tampouco as circunstâncias. Sua imagem de pureza, de integridade e de defensora intransigente de princípios foi bastante golpeada desde o compromisso com o PSB. A própria Rede já nascera como produto de uma maionese política, intelectual e financeira. Banqueiras, bilionários de cosméticos e economistas ortodoxos passaram a dividir sessões de meditação com a moçada sonhática, adoradores de bagres e gente bem intencionada à procura de rumo. Difícil saber o resultado desse emaranhado ideológico quando o assunto é dirigir um país.

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