Os protestos pegaram o mundo político de calças curtas.
Comecemos pela oposição.
Depois de passar a última década procurando convencer a população a
sair às ruas com base num moralismo falso e seletivo, a oposição reagiu
de acordo com o reflexo condicionado do conservadorismo brasileiro.
Sua primeira atitude foi clássica: dar porrada nos protestos e na
mobilização popular. Tratou todo mundo como baderneiro e aplaudiu balas
de borracha. No momento mais difícil, vangloriou-se do que fazia.
Ao perceber que os “vândalos” e “baderneiros” poderiam ter uma função
útil caso fossem instrumentalizados para combater o governo Dilma, a
oposição procura promover uma transmutação política.
Quer entrar no vácuo da luta contra os 0,20 centavos e encontrar novos aliados em sua guerra eleitoral para 2014.
É por isso que muitos observadores e comentaristas insistem em dizer
que a luta envolve bandeiras maiores e mais amplas. Receosos de entrar
num terreno perigoso, o das reivindicações populares, a tática é criar
um guarda-chuva ideológico.
Tenta-se diluir um compromisso que interessa à maioria da população, para criar um atalho para 2014.
Vamos combinar.
Para quem perdeu três eleições presidenciais desde 2002 e arranca os
cabelos diante das pesquisas eleitorais disponíveis para 2014, até uma
insólita aproximação com o anarquismo e práticas autonomistas se tornou
uma esperança.
E se pelo menos uma fatia dessa juventude resolver engrossar o bloco de oposição no ano que vem?
É este o exercício que o conservadorismo brasileiro decidiu experimentar.
Resta saber se será bem-sucedido neste canto de sereia – ou não.
Em vez de seguir o tratamento de “vândalos” pré-criminosos, eles foram
repaginados, tomaram um banho de butique ideológica e agora são
apresentados com bons moços, herdeiros das melhores lutas políticas de
um país onde, mais uma vez, se diz que “tudo” precisa mudar.
(Na real, este “tudo” consiste em revogar as principais conquistas
sociais instituídas de 2003 para cá e dar um jeito de tirar essa
discussão sobre tarifa de ônibus da frente...)
Mas a mobilização também pegou o PT e seus aliados no contrapé.
Os protestos revelaram a distancia entre um partido que tem um
histórico na melhoria do transporte público, a começar pela criação do
Bilhete Único, e os militantes independentes que há anos se dedicam a
esse combate, preferindo seguir uma direção própria, com métodos
próprios de organização e reivindicação.
Há anos que o MPL denuncia o preço das passagens nas principais capitais do país. A história lhe deu razão.
Centro das manifestações em função de um aumento de 0,20 centavos, a
prefeitura de São Paulo perdeu uma ótima oportunidade para negociar.
Durante três dias, Fernando Haddad fez companhia a Geraldo Alckmin, o
governador que tem imposto um ambiente de Estado Policial a São Paulo
toda vez que é colocado diante de mobilizações de caráter político.
Não vamos esquecer. Neste período foram feitas dezenas de prisões
arbitrárias e vários militantes foram enquadrados em crimes absurdos e
inaceitáveis para quem exerce o direito legítimo de defender seus
direitos – como formação de quadrilha.
Neste jogo delicado, incerto, pode-se resolver um trunfo importante da campanha de 2014.
Todos estarão atentos e cada movimento pode ser decisivo.
Ninguém é bobo embora muita gente goste de se fazer de ingênuo.
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