Janio de Freitas
O não dito pelo dito
O não dito pelo dito
A frase "nós dois somos possibilidades e sabemos disso", emitida por
Marina Silva, é a precipitação talvez involuntária, mas certamente
sincera e sem dúvida verdadeira, de um desmentido que atinge Eduardo
Campos e sua candidatura pelas costas.
É clara e objetiva a admissão de candidatura própria na frase de Marina
Silva, recolhida por Ranier Bragon e Matheus Leitão (Folha de ontem).
Frase que não ficou contida por mais do que umas 24 horas após a
revelação, pelo intermediário da entrada de Marina Silva no PSB, de que
Eduardo Campos recebeu com resistência a proposta de adesão, preocupado
em salvaguardar sua candidatura. Argumentou que não poderia retirá-la, e
perguntou: "Vou ser constrangido?" [a retirá-la].
Resposta contada aos mesmos repórteres pelo próprio interlocutor de
Eduardo Campos, deputado Walter Feldman: "Eu disse: A Marina pretende te
apoiar, você não será constrangido a retirar sua candidatura, queremos
uma aliança programática. Estamos no seu projeto".
Em texto dos dois entrevistadores: "Segundo relato do deputado, ele
disse ao governador que Marina não tinha essa intenção [JF: de ser a
candidata à Presidência] e que pretendia (mesmo com 26% das intenções de
voto na última pesquisa Datafolha) apoiar o pessebista, com apenas 8%".
Ainda na relato de Feldman, Eduardo Campos relutou ante a sugestão de um
encontro com Marina Silva, temeroso de desgaste se a conversa
fracassasse. Por fim concordou, foi encontrá-la em Brasília, e nenhuma
candidatura esteve sob condição.
Mas está. Desde já. Ou, quem sabe, desde antes. Eis o trecho todo nas palavras de Marina Silva:
"Para nós, não interessa agora ficar discutindo as posições. Nós dois
somos possibilidades e sabemos disso. Que possibilidade seremos, o
processo irá dizer e estamos abertos a esse processo".
Bem nítido: "Não interessa [discutir] AGORA", o mesmo que dizer da
expectativa já existente de discutir a questão adiante. Quando? Não será
Eduardo Campos a ter a palavra a respeito. Nem será o PSB que a
decidir. "O processo irá dizer." E, mais do que falar por si, Marina se
permite falar pelo próprio Campos: "ESTAMOS abertos a esse processo".
O oposto do assegurado a Eduardo Campos, como relatado por seu
interlocutor, intermediário de Marina Silva e testemunha do encontro,
Walter Feldman, que deixou o PSDB para acompanhar sua líder no projeto
via PSB.
A situação de Eduardo Campos não deixa de ter graça. Ele começa a
mostrar-se a verdadeira Dilma Rousseff imaginada nas tantas loas à
jogada "brilhante e inovadora" de Marina Silva ao incorporar-se à
candidatura do PSB, contra a da presidente à reeleição. Ao menos desde
ontem pela manhã, quando publicada a entrevista de sua nova associada,
Eduardo Campos só pode ser um exemplo de apreensão. Mas sorridente,
muito sorridente. Obrigado a sorrir, a repetir-se feliz com o acordo e,
claro, absolutamente confiante no apoio de Marina. E, quanto mais se
mostre assim, mais será o contrário.
Até por uma possível dor nas costas.
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