A direita brasileira já foi melhor. Teve nomes como Roberto Campos e
José Guilherme Merquior entre seus quadros, formulando sobre teoria
econômica e política internacional. Naquele tempo, a direita recorria a
argumentos, além do porrete. Hoje restou apenas o porrete, aplicado a
esmo sem maiores requintes de análise.
Impressiona o baixo nível intelectual dos representantes da direita no
debate público nacional. Não elaboram, não buscam teoria nem
referências. Não fazem qualquer esforço para interpretar seriamente a
realidade. Apenas atiram chavões, destilando preconceitos de senso comum
e ódio de classe.
Reinaldo Azevedo é hoje o maior representante dessa turma. Com 150 mil
acessos diários em seu blog mostra que há um nicho de mercado para suas
estripulias. Ao lado dele tem gente como Rodrigo Constantino, aquele que
se orgulha das viagens a Miami e se despontou como legítimo defensor
dos sacoleiros da Barra da Tijuca.
Antes os intelectuais de direita iam fazer estudos em Paris. Agora vão comprar roupas em Miami. Sinal dos tempos e das mentes.
Dispostos a tudo para fazer barulho no debate público, mas sem
substância em suas análises, aproximam-se frequentemente de um discurso
delirante.
Reinaldo Azevedo jura que o governo petista quer construir o comunismo
no Brasil. E vejam, ele não está falando do Lula de 1989, mas do governo
do PT de 2003 a 2014. Sim, o mesmo que garantiu lucros recordes aos
bancos e empreiteiras na última década. Que manteve as bases da política
econômica conservadora e que nem sequer ensaiou alguma das reformas
populares historicamente defendidas pela esquerda. Neste governo que,
com muito esforço, pode ser apresentado como reformista, ele enxerga
secretas intenções socializantes. Certamente com o apoio da Odebrecht e
de Katia Abreu. Só no delírio...
Para ele, João Goulart é que era golpista em 64. Os black blocs são
amigos do ministro Gilberto Carvalho. E as pessoas só são favoráveis às
faixas exclusivas de ônibus por medo de serem acusadas de elitistas. Ah
sim, sem esquecer que a mídia brasileira - a começar pelas Organizações
Globo - é controlada sistematicamente pela esquerda.
Ele baba, ele xinga. Ofende os fatos e fantasia perigos. Lembra, embora
com menos poesia, dom Quixote atacando os moinhos de vento.
A pérola mais recente é escabrosa: Israel seria vítima do marketing
internacional do Hamas. No momento em que o mundo vê a olhos nus
centenas de palestinos serem massacrados na Faixa de Gaza, ele denuncia
uma conspiração internacional de mídia contra o Estado de Israel.
Encontrou eco no também direitista delirante Luis Felipe Pondé, em
artigo nesta Folha.
Teoria da conspiração vá lá, até pode ter seu charme; mas, como dizia
Napoleão, entre o sublime e o ridículo há apenas um passo. Reinaldo
Azevedo e seus sequazes já atravessaram faz tempo esta fronteira.
De fato, os textos que têm se prestado a publicar acerca do genocídio na
Palestina já superaram o ridículo. Chegaram ao cinismo. Dizer que as
crianças mortas na Faixa de Gaza são marketing é uma afronta do mesmo
nível da deputada sionista que defendeu o extermínio em série das
mulheres palestinas para impedir a procriação. É apologia covarde ao
genocídio e ao terrorismo de Estado.
A direita se diferencia da esquerda, dentre outras coisas, pela análise
dos fatos. Mas não por criar fatos ou ignorá-los. Ao menos quando
tratamos de uma direita séria.
No caso de Reinaldo Azevedo e dos seus, estamos num outro campo. Não é
apenas a direita. É uma direita delirante. A psiquiatria clínica é
clara: negação dos dados da experiência, somada a uma reconstrução da
realdade pela fantasia chama-se delírio. Aqui há ainda o agravante da
fixação em temas recorrentes. PT, movimentos populares e mais uns dois
ou três.
Um delírio em si é inofensivo. O problema é quando começa a juntar
adeptos, movidos por ódio, preconceitos e mentiras. É assim que nascem
os movimentos fascistas. Quem defende extermínio higienista em Gaza
também deve defendê-lo no Complexo do Alemão ou em Paraisópolis.
Reinaldo Azevedo certamente ainda não representa um risco político real,
mas o crescimento de seus seguidores é um sintoma preocupante da
intolerância e desapego aos fatos que ameaçam o debate público no
Brasil.
Nenhum comentário:
Postar um comentário