É pior a emenda que o soneto, dizia minha velha avó.
Os pareceres dos ex-ministros Carlos Velloso e Ayres Brito, do Supremo Tribunal Federal, chovem no molhado.
Tratam de, como dizem os advogados, “lana caprina”: coisas desimportantes
É evidente que não é irregular fazer uma obra em terreno com a imissão
de posse. Do contrário, uma ponte, um viaduto, uma avenida teriam de
esperar até as calendas para serem feitos, pois a Justiça brasileira é o
que é.
E nem mesmo que parentes ou até o próprio governador do Estado possam ter terras desapropriadas por interesse social.
Absurdo seria o contrário, porque, então, ser mandatário ou parente de
mandatário significaria ter direitos acima dos que têm o cidadão comum,
pois seus imóveis ficariam “blindados” contra desapropriações.
E isso, ao menos na lei, é impensável.
O problema da obra do aeroporto — além do superfaturamento, que já
evidenciamos aqui e não apetece a imprensa — é de natureza
administrativa e ética.
O problema, não, os problemas.
O primeiro deles é a prioridade da obra: um aeroporto para um município
que não chega a 30 mil habitantes e a 36 km em linha reta de outro já
existente e de ótima capacidade, inclusive para operações noturnas, em
Divinópolis. Onde, aliás, reabasteceu-se 0 malsinado helicóptero
Perrella.
Mas Cláudio, sendo um pequeno município que tem a singular
característica de sediar, a apenas seis quilômetros da pista de pouco, a
fazenda de Aécio, o Governador que determinou a obra.
O segundo problema é o custo da desapropriação. Qual foi a base, o
valor venal do imóvel, como corriqueiro, ou seu valor de mercado e,
neste caso, qual é?
O senhor Aécio Neves diz que a opção, que implicou oferecer um milhão de reais a seu tio-avô, era “a mais barata”.
Se o “titio” tivesse aceito um valor simbólico — mil reais, digamos — nada haveria a questionar.
Mas o Estado lhe ofereceu um milhão de reais e ele, ainda assim, não aceitou.
Nos autos do processo, certamente, deve haver sua pretensão: dois, três, quem sabe dez milhões?
Se a Justiça arbitrar R$ 2 milhões, ainda será o “mais barato”. Ou três?
O terceiro problema é o ético.
Se o titio, sem se comover com o pedido do sobrinho e com o
desenvolvimento econômico do município — razão que alega Aécio para a
urgência da obra — não concordou com uma desapropriação simbólica,
porque é que não se procurou alternativas para, já que se pagava a
mercado (será?) e caro, fazê-lo a quem não poderia ser acusado de
favorecimento?
Do outro lado da estrada havia um terreno igualmente plano, desimpedido e até maior.
O quarto problema é também de natureza ética. E vergonhoso.
Como é que se deram pareceres um mês antes do assunto vir à tona e seis anos depois da decisão ser tomada?
Não foram, ao menos pelo que indica a data aposta ao parecer de
Velloso, feitos para dirimir dúvida sobre realizar ou não o investimento
público ou, muito menos, para responder ao clamor público.
Não creio que um ex-ministro do Supremo, para contratar-se a um serviço
de emissão de parecer, fosse capaz de fraudar a data. É provável,
mesmo, que se trate de um erro material, ao escrever junho no lugar de
julho.
Isso, porém, elide o mais importante da interpretação do episódio.
É que Aécio, fragilizado moralmente, correu a cobrir-se de pareceres que afirmam o óbvio, para ocultar o ignóbil.
Porque não há parecer que esconda o fato de que a obra não era
essencial senão para seu conforto, tanto que “funciona” há quatro anos
como pista privada, trancada a chave, salvo nos momentos em que serve de
área de lazer a aeromodelistas.
Assim como não se poderá ocultar o preço astronômico de uma simples
faixa de asfalto e um alambrado e menos ainda se explicará o
asfaltamento de uma pista capaz de receber jatos no Norte de Minas, em
Montezuma, um município pobre, paupérrimo, com sete mil e pico de
moradores.
Onde, aliás, está outra propriedade do senador, esta vinda de “usucapião” de terras devolutas do Estado que governava.
Aécio Neves não entendeu que o Brasil é uma república, não uma sesmaria.
Serraram-lhe as asas, e ele está apavorado.
Fernando Brito
No Tijolaço
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