Os verdadeiros motivos da fúria
Do Direto da Redação - Publicado em 04/06/2013
Mário Augusto Jakobskind
A grande onda da mídia de mercado (todos os grifos em verde negritado são do ContrapontoPIG) nestes dias tem sido criticar com
extrema dureza a Presidenta argentina Cristina Kirchner. O Globo e
outros dez jornais da América Latina publicaram durante vários dias uma
série de reportagens sob o título Liberdade Ameaçada. Cristina e o
já falecido Nestor Kirchner foram acusados de tudo que se possa
imaginar em matéria de corrupção e de ações visando restringir a
liberdade de imprensa.
Pelo que foi dado a conhecer, a Argentina está a beira do caos, mas o
ódio maior da mídia de mercado sem dúvida é a lei dos meios de
comunicação, discutida por mais de três anos pelos movimentos sociais,
aprovada pelo Congresso e sancionada pela Presidenta atual. A reforma da
Justiça também foi criticada com veemência.
Na verdade, como se trata de uma campanha sistemática com o visível
intuito de desprestigiar o projeto de Cristina Kirchner e debilitar seus
seguidores nas próximas eleições legislativas (as reportagens foram
divulgadas também pelo jornal Clarin), as matérias deram pouco ou quase
nenhum espaço para os defensores da presidenta.
Apesar das críticas diárias, que continuarão, outras matérias acusam
os seguidores dos Kirchner de estarem preparando um projeto que permita a
Cristina concorrer a um terceiro mandato. Nesse ponto, a mídia de
mercado cai em contradição.
Ao mesmo tempo em que revela um grande
desgaste da imagem da presidenta, fica visível a preocupação por ela
aspirar nova reeleição. Mas se Cristina está tão desgastada, qual o
motivo do temor?
Na verdade, além da lei dos meios de comunicação e da reforma da
Justiça, a mídia de mercado nunca se conformou com o fato do atual
governo não seguir o receituário do capital financeiro internacional.
Nesse sentido, tudo precisa ser feito em matéria de desgaste de
Cristina.
O mesmo raciocínio vale para presidentes como Rafael Correa, do
Equador, Evo Morales, da Bolívia e o mais recente, Nicolás Maduro, da
Venezuela. Todos eles são duramente criticados diariamente nas
publicações dos integrantes do chamado Grupo de Diários América (GDA),
que na verdade se comportam muito mais como partidos políticos
defensores de projetos favoráveis ao Estado mínimo do que órgãos de
imprensa propriamente ditos.
Os meios de comunicação de mercado citados dificilmente informarão
aos seus leitores, ouvintes e telespectadores sobre o fato de as políticas do governo da República Bolivariana
da Venezuela terem reduzido o indicador de fome em 86% nos últimos 14
anos, exatamente desde a ascensão do Presidente Hugo Chávez.
Quem reconhece esse índice na Venezuela é a Organização das Nações
Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO). Vale ressaltar também que
a mesma FAO estabelece como meta para 2015 que os governos dos países
reduzam os índices de desnutrição à metade do que tinham em 1990. A
Venezuela naquele ano apresentava o índice de 11% e mesmo em 2010
alcançou 2%, ou seja, menor até do que o estipulado pelo organismo da
ONU.
Mas em matéria de Venezuela, o espaço da mídia de mercado fica por
conta de Henrique Capriles Radonsky, que segue deslegitimando a eleição
de Nicolás Maduro no pleito presidencial de 14 de abril último com a
acusação, sem provas, de fraude. O candidato derrotado, por pouca margem
(pouco mais de 1,5%), mas derrotado, conta com o apoio do governo
estadunidense. Capriles andou circulando pelo exterior sendo recebido
pelo Presidente colombiano Juan Manuel Santos.
Já os seguidores de Capriles, como a deputada Maria Corina Machado,
estiveram recentemente no Chile. A parlamentar se entendeu muito bem com
pinochetistas eméritos, entre os quais Hernán Felipe Errázuriz Correa,
ex-Ministro do Exterior e também de Minas, além de presidente do Banco
Central, durante o regime sanguinário chileno.
A divulgação do encontro entre correligionários foi noticiado pelo jornal El Mercurio,
que integra o tal Grupo de Diários América e que antes do golpe contra o
presidente Salvador Allende foi contemplado pela CIA com 1,5 milhão de
dólares.
Outra importante informação também praticamente ignorada pela mídia
de mercado brasileira foi a criação pela Unasur (União das Nações Sul
Americanas) da primeira Escola Sul Americana de Defesa (Efuse) com o
objetivo de formar militares dos 12 países integrantes da instituição. O
ensino da Efuse será no contexto do pensamento estratégico
essencialmente sul americano e promoverá intercâmbio de professores e
alunos, civis e militares nos programas.
Mas os questionadores do comportamento partidário dos meios de
comunicação de mercado são acusados de ferir a liberdade de expressão e
de imprensa, quando acontece exatamente o contrário.
Por estas e muitas outras, as ferozes críticas a Cristina Kirchner,
Rafael Correa, Evo Morales e Nicolás Maduro devem ser entendidas como
campanhas contrárias a quem não segue o receituário do pensamento único,
defensores do estado mínimo
Mário Augusto Jakobskind. É
correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador
do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da
Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de
Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia,
Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBO
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